Conhecer mais com o “Comboio da Memória”


O projeto Comboio da Memória tem proporcionado à comunidade escolar viagens bastante interessantes e descobertas profundas, deveras enriquecedoras do ponto de vista cultural, pedagógico e humano, que resultam sempre em experiências inesquecíveis para os nossos alunos. São vivências que em muito contribuem para a sua formação pessoal e cívica, consciencializando-os para a “importância da memória e para o respeito pela diferença”, fazendo jus aos objetivos definidos pela coordenadora do projeto, professora Isabel Vicente, aquando da sua criação. Privilegiando a temática do Holocausto e da Tolerância entre os Povos e tendo em mente os valores humanistas, foram acontecendo várias iniciativas, excelentes oportunidades de aprendizagem, com destaque, entre outras, para a realização de encontros com personalidades convidadas, dinamização de sessões de trabalho com alunos, intercâmbios, exposições, sessões de cinema, comemoração do “Dia Internacional em Memória das Vítimas do Holocausto”, programação de viagens, desde as mais longas (rumo a Auschwitz) a visitas de estudo mais curtas que levam à descoberta da nossa cultura e da nossa história.

Foi assim que aconteceu, nos dias 7 e 8 de julho, com mais uma viagem no Tempo e na História, desta vez por terras raianas, assinalando a “Rota da Paz” com o seguinte itinerário: Almeida – Vilar Formoso – Sabugal – Sortelha – Belmonte.

Na vila histórica de Almeida, visitámos a fortaleza com a sua forma de estrela de doze pontas que constituiu um exemplar sistema defensivo nos confrontos fronteiriços que foram ocorrendo, principalmente no rescaldo do domínio filipino e nas invasões francesas. Um dos vários pontos de interesse foi a visita ao Museu Histórico-Militar que está inserido nas galerias subterrâneas construídas para efeitos de defesa militar, revelando a árdua tarefa que esta localidade teve de suportar com as incursões dos vários invasores ao longo dos séculos, chegando a ficar cercada. Ainda no concelho de Almeida, visitámos o Museu “Vilar Formoso Fronteira da Paz” – Memorial aos Refugiados e ao Cônsul Aristides de Sousa Mendes – que assinala, de forma intensa e muito bem documentada, a passagem dos refugiados por Portugal, durante a II Grande Guerra, e dá a conhecer histórias de famílias judias que fugiram às tropas nazis. O museu, instalado junto à estação ferroviária de Vilar Formoso, porta de entrada em Portugal e terra reconhecida pelos refugiados pela sua hospitalidade, foi inaugurado em agosto de 2017 e está integrado na “Rede de Judiarias de Portugal – Rotas de Sefarad”. Contempla seis núcleos expositivos relacionados com as temáticas “Gente como nós”, “Início do pesadelo”, “A viagem”, “Vilar Formoso fronteira da paz”, “Por terras de Portugal” e “A partida”.

O dia 7 terminou no Sabugal e, no âmbito da visita, além das bonitas margens do Côa, mereceram a nossa atenção alguns aspetos da cultura local e do património, destacando-se o imponente Castelo das Cinco Quinas, uma das muitas edificações defensivas da região da raia, e o espaço museológico “Casa da Memória Judaica da Raia Sabugalense”, inaugurado em março de 2017, integrado também no “Projeto Rotas de Sefarad – Valorização da Identidade Judaica Portuguesa no Diálogo Interculturas” que evoca a presença de judeus, nesta antiga vila, desde tempos medievais até hoje. Na manhã do dia 8, subimos até às muralhas de Sortelha, uma das mais bem conservadas e bonitas Aldeias Históricas da Beira Interior, que cresceu no cimo de um monte por questões defensivas, caracterizando-se pelas suas casas de granito, pelas ruas tipicamente medievais, fechadas por um circuito de muralhas, e pelo castelo do séc. XIII de onde os mais corajosos puderam desfrutar de uma enorme vista panorâmica.

A última paragem deste “Comboio da Memória” foi na histórica vila de Belmonte, terra natal do descobridor do Brasil Pedro Álvares Cabral, cuja memória é bastante evocada, começando, desde logo, pelo Museu dos Descobrimentos – Centro Interpretativo “À Descoberta do Novo Mundo”, projeto interativo que transporta o visitante para uma história de 500 anos de construção de um País e da Portugalidade, com destaque para as viagens marítimas, em especial a do filho da terra. De seguida, visitámos o Museu Judaico, dado que em Belmonte ainda existe uma comunidade judaica que, depois de viver em segredo e de resistir a várias expulsões, dá agora a conhecer aos visitantes deste espaço museológico a sua história e a forma como sobreviveu no nosso país. A existência desta comunidade, no interior de Portugal, é reconhecida oficialmente em 1989 e em 1996 é inaugurada a sua Sinagoga numa das ruas da antiga judiaria. Tivemos o privilégio de ser recebidos, nesse local de culto, por um membro da comunidade judaica de Belmonte que muito gentilmente nos explicou a simbologia do espaço e a sua funcionalidade, abordando aspetos da cultura e tradição hebraicas ao longo dos tempos e na atualidade.

Numa época em que ainda perduram atentados contra pessoas, estas experiências, pelo seu cariz multicultural e pedagógico, motivam-nos para levar a cabo abordagens didáticas capazes de levar os alunos a compreender a “importância da memória e o respeito pela diferença”, para que não se repitam os erros do passado. É essa consciencialização para a necessidade de agir inerente à génese deste projeto que o torna excecional.

Jacinta Correia