Passados, paradigmas e perspetivas


Embora muitas vezes associado ao normal funcionamento do ano letivo, o trabalho do Centro Qualifica do Agrupamento de Escolas de Pombal não segue as mesmas janelas temporais. Por isso, ainda o novo ano letivo tinha acabado de espreitar quando já dois candidatos de comunidade cigana, que realizaram processo de RVCC de Nível Básico, preparavam-se para a última etapa deste percurso: a sessão de júri de certificação, que ocorreu no dia 26 de setembro.

Independentemente dos motivos que os levaram a deixar o percurso escolar, no devido tempo, para trás, chegaram até nós apresentando alguns denominadores em comum: acreditam que ainda que curta, se essa etapa não tivesse existido “jamais teriam aprendido a ler e escrever, retirando assim praticamente toda a possibilidade de poder levar uma vida sem depender da ajuda de outras pessoas”; pretendiam realizar o processo o mais rapidamente possível, cumprindo os requisitos a que este obriga, mas os imprevistos que se adensaram provaram-lhes que “quanto mais depressa, mais devagar”; reconhecem que o seu futuro não passa pelo legado transmitido pelo seu histórico familiar – as feiras – e que lhes compete um papel ativo na mudança de paradigma no sentido de uma efetiva integração social.

De facto, hoje, mais do que apenas ler as palavras, impera a necessidade de ler o mundo, pois já Paulo Freire defendia que só faz sentido o esforço de ler o texto se for para compreender o mundo, para nos compreendermos nele e o modificarmos na perspetiva da liberdade e da emancipação humana.

Se nem sempre foi fácil urdir a teia de saberes e de competências que naquele dia o C. e a T. apresentaram e defenderam perante o júri, a equipa do Centro acredita que terá sido um bom exercício de reflexão sobre o passado, mas também sobre o que almejam para cada novo “amanhã”, numa perspetiva de crescimento pessoal e profissional.

 

Isabel Moio – Técncia de ORVC

O caminho da aceitação


Com alguma frequência ouvimos discursos desconfiados relativamente à forma como funciona o processo de RVCC, muitas vezes assentes no receio que a construção do portefólio invada a privacidade de quem procura uma via para aumentar as suas qualificações. Quando entrou no nosso Centro, G. também carregava esse medo aos ombros, incerta se este seria o caminho mais ajustado às suas características. Com o tempo, foi baixando a guarda, entendendo que estava nas suas mãos a decisão de quanto de si e da sua história queria depositar nas páginas do seu portefólio. Foi logo nas primeiras sessões que assumiu o compromisso “desistir não é opção” e foi com essa determinação que compareceu no dia doze de outubro para a sessão de júri de certificação.

Com orgulho apresentou as problemáticas em torno da imigração, inspirada pela perspetiva defendida por Yuval Harrari no seu livro “21 Lições para o Século XXI”.

Com mais uma etapa concluída com sucesso, o caminho continua, pois nunca se deve confundir aceitação e resignação. Só depois de aceitarmos as coisas que não controlamos, é que conseguimos mudar aquilo que realmente depende das nossas ações.

Miakel Mendes – Técnico de ORVC

Regresso ao Futuro


No filme “Regresso ao Futuro” de 1985, a personagem principal viaja até ao passado, acabando numa aventura para preservar o seu presente. Sem precisar de um DeLorean, o processo de construção do portefólio é quase como uma viagem pelo tempo e espaço, pois permite aos candidatos relembrar as suas experiências e por onde passaram. Esta viagem tem sempre um efeito positivo, mesmo quando se reconhece que haveria coisas a mudar. É com orgulho que os candidatos destacam as aprendizagens que foram realizando, os obstáculos que foram ultrapassando e as marcas que foram deixando. O passado mantem-se presente por fazer parte integrante da matriz de quem somos, mas somos muito mais do que a soma das nossas experiências.

Os candidatos que se apresentaram a júri de certificação no passado dia um de junho são exemplos disso mesmo. Com personalidades muito diferentes, cada um expandiu horizontes a cada viagem e com cada vivência. Retiram dos respetivos processos RVCC o máximo de aprendizagens, confiando um pouco mais nas suas capacidades, tal como o pássaro que não teme pousar num galho mais frágil, por confiar na força das suas asas.

Mikael Mendes – Técnico de ORVC

O despertar para mais


“Nunca é tarde para aprender” é uma das expressões mais ouvidas pela equipa por parte dos candidatos que realizam o Processo de RVCC. No entanto, mais do que o despertar de novas competências, o Processo de RVCC é a tomada de consciência de que em qualquer momento da nossa vida podemos aprender e de que, quando reunimos todos os esforços, somos capazes de alcançar os nossos objetivos.

Os dois candidatos certificados no passado dia 26 de maio foram exemplo disso pois, inúmeras vezes tiveram de abdicar dos seus compromissos familiares e até profissionais para poderem cumprir com os desafios propostos pela equipa.

Foi com enorme orgulho que verificámos que a conclusão deste Processo lhes aguçou o desejo de continuarem a investir no seu percurso formativo e, por isso, desejamos que a conclusão de ensino secundário seja apenas o primeiro passo para um percurso formativo desafiante e enriquecedor.

Afinal, como referiu Leonardo da Vinci “aprender é a única coisa de que a mente nunca se cansa, nunca tem medo e nunca se arrepende”.

 

Patrícia Amado – Técnica de ORVC