Ciência e Sociedade


É inegável que a qualidade de vida em geral tem aumentado um pouco por todo o mundo e que isso só foi alcançado graças ao desenvolvimento científico e tecnológico. Contudo, ainda existem vozes que se levantam para por em causa factos comprovados, indo contra milhares de estudos e até daquilo que uma simples observação pode corroborar. Se há áreas em que a subjetividade é uma parte integrante, como a religião ou a arte, noutras deve prevalecer o raciocínio objetivo. E não deveríamos escolher ao sabor do vento, quando e em que temáticas reconhecemos validade ao conhecimento científico. O “achismo” e as opiniões assentes em meras perceções devem ficar confinadas às conversas de café e mesmo aí a sua utilidade é questionável. Mas se há quem se recuse a ver as evidências, por teimosia ou má vontade, também existem muitos de nós que apenas são condicionados pela desinformação que circula. Felizmente, existem autores que se dedicam ao esclarecimento de equívocos e divulgação da ciência, tal como é o caso de David Marçal. No seu livro “Como perder amigos rapidamente” de 2024 desconstrói algumas ideias erradas, apresentando factos científicos, num texto de fácil leitura bem-humorado. E foi esta a obra usada pelos dois candidatos que se apresentaram à sessão de júri de certificação de nível secundário do dia 20 de março de 2025.

A primeira apresentação[1] focada nos capítulos “Como estragar a conversa de circunstância” e “Como ser cancelado”, começou por desafiar a nossa perceção da realidade, demonstrando com dados do Gapminder que o mundo está cada vez melhor. No entanto o tom utilizado nos meios de comunicação tem-se tornado mais negativo, contaminando a nossa visão do mundo. Isto não significa que não haja coisas a mudar, apenas que as conquistas alcançadas nos últimos anos não são negligenciáveis. Não é só o jornalismo que condiciona a nossas ideias, também os filmes e livros podem induzir-nos em erro, por exemplo contrariamente ao que é por vezes veiculado, a ciência não é uma aliada das ditaduras. Com o movimento pós-moderno, que defende a subjetividade da verdade, alegando que são reforçadas determinadas teorias como forma de controlo e poder, surge também a confusão entre opinião e facto.  No entanto é com o método científico que encontramos respostas para temas polémicas como é o caso da participação de mulheres transgénero em categorias femininas de desporto. É graças à ciência que conseguimos desenvolver a medicina para respeitar as características de diferentes populações, sem ressuscitar a ideia comprovadamente errada de existirem raças humanas. Mesmo que alguns momentos da história possam ter a si associados ideais ou acontecimentos terríveis, isso não pode servir para apagar as conquistas alcançadas nesses mesmos períodos, por exemplo apesar de durante os Descobrimento ter havido escravatura, esta época marca grandes desenvolvimentos científicos e tecnológicos que possibilitaram a descoberta da rota marítima para a Índia e a potencialização da globalização.

A segunda apresentação[2] dedicou-se aos capítulos “Como criar mau ambiente” e “Como arranjar problemas de saúde”. No que ao ambiente diz respeito e apesar da extensa bibliografia científica que comprova a existência do aquecimento global, ainda há quem ponha em causa este fenómeno. Mas se o negacionismo é problemático, no outro polo temos discursos alarmistas, que ignoram os dados, para semear o pânico. Por exemplo, não se espera que o aquecimento global leve a um colapso social, sendo que as Nações Unidas até preveem o aumento da população mundial até 2100. Também a ideia de que as alterações climáticas potenciaram a fome tem algumas lacunas, por não ter em conta o aumento muito significativo da produtividade agrícola dos últimos anos. Se nesta história o dióxido de carbono tem sido o vilão, não devemos esquecer-nos que foi graças à Revolução Industrial, assente na utilização de combustíveis fósseis, que se impulsionou a economia e a melhoria das condições de vida. Outro vilão incompreendido tem sido a energia nuclear, que contrariamente às ideias populares, representam grandes vantagens quando comparadas com outras fontes de energia (mesmo as renováveis). A verdade é que há cada vez mais empresas a rentabilizarem produtos ditos ecológicos, mesmo quando não o são (“greenwashing”), como foi o caso das trotinetes que apenas são mais verdes quando comparadas com uma viagem de carro a combustão. Já no que concerne o tema da saúde, apesar do elevado número de pacientes que procuram as terapias alternativas estas são pseudociências, no sentido em que existem pouquíssimos estudos que comprovem a sua eficácia e estes apresentam sérios problemas metodológicos. Assim o mais provável é que os benefícios relatados por quem recorre a estas técnicas estejam apenas a sentir um efeito placebo. Para uma análise mais detalhada dos estudos relativos a terapias alternativas, nomeadamente a acupuntura, é possível consultar o site cochrane.

[1] https://gamma.app/docs/Como-Perder-Amigos-Rapidamente-Comunicacao-Social-e-Sociedade-1v6ttmxz8e3yasy

[2] https://gamma.app/docs/Como-Perder-Amigos-Rapidamente-Ambiente-e-Saude-ifury4afld1irf3

 

Mikael Mendes – Técnico de ORVC